- Pesquisadores em uma expedição no delta do rio Amazonas encontraram manguezais crescendo em água doce – um fenômeno nunca antes documentado em deltas ou manguezais costeiros em qualquer outro lugar do mundo.
- Os manguezais, negligenciados pelos esforços anteriores de mapeamento por satélite, aumentam a área conhecida de manguezais na região em 20%, ou mais 180 quilômetros quadrados (70 milhas quadradas).
- Os manguezais são um sumidouro de carbono mais eficaz do que outros tipos de floresta tropical, com mais de 8% de todos os estoques de carbono em todo o mundo nos manguezais do Brasil.
- Apesar de seus muitos serviços ecossistêmicos, os manguezais não são bem protegidos ou financiados no Brasil.
Em uma expedição no delta do rio Amazonas, os pesquisadores encontraram manguezais crescendo em águas com pouca ou nenhuma salinidade e sobrepondo-se a pântanos florestais de água doce – um fenômeno nunca antes documentado em deltas ou manguezais costeiros em qualquer outro lugar do mundo.
Os manguezais são árvores e arbustos resistentes que se adaptaram para viver principalmente em água salgada nas zonas intertidais em mudança ao longo das costas marinhas. Os exploradores da National Geographic Angelo Bernardino e Thiago Silva encontraram esses manguezais únicos de água doce em abril de 2022 durante uma expedição de duas semanas que fez parte do maior, de dois anos National Geographic e Rolex Perpetual Planet Amazon Expedition.
Os manguezais foram negligenciados por esforços anteriores de mapeamento por satélite. Sua identificação aumenta a área conhecida de manguezais na região em 20%, ou mais 180 quilômetros quadrados (70 milhas quadradas). Os resultados foram publicados em 20 de julho na revista Biologia Atual.
“Foi fenomenal ver esse tipo de floresta inundada de água doce neste ambiente”, disse Bernardino, ecologista marinho, em um comunicado à imprensa. “Esta descoberta é fundamental para entender melhor as complexidades das florestas de mangue e como elas são cruciais para as comunidades locais que as cercam”.
Esta área de manguezais de água doce única foi encontrada no Delta do Amazonas, a região onde o maior rio do mundo encontra o oceano. Aqui, a nuvem de água que sai da foz do rio, combinada com a alta pluviosidade da área, libera um enorme volume de água doce a noroeste ao longo da costa do Brasil. Os cientistas dizem que os manguezais de água doce que crescem aqui são uma forte evidência da adaptabilidade do ecossistema ao fluxo do rio Amazonas.
“Descobrir uma grande área de árvores mistas de mangue e floresta de água doce ao longo dos trechos estuarinos superiores da Bacia Amazônica é significativo, uma vez que a maior parte da sobreposição de terras úmidas de maré é restrita em área”, Ken Krauss, ecologista pesquisador do US Geological Survey, que não esteve envolvido no estudo, disse a Mongabay.
Bernadino e Silva exploraram 11 florestas de mangue na área, medindo a água dos poros do solo, salinidade, composição das plantas e densidade e volume das árvores. Eles usaram varredura a laser 3D de drones e do solo, permitindo que eles “desenvolvam novos métodos para estimar os estoques de carbono, seguir onde estão as árvores individuais e até ver canais subterrâneos de vegetação”, disse Silva, coautor do estudo. “É fascinante.”
Embora esses manguezais em particular sejam únicos, eles provavelmente ainda fornecem muitos dos serviços ecossistêmicos críticos que os manguezais de água salgada mais típicos fornecem, como capturar carbono, proteger as costas da erosão, servir como berçário de muitos peixes e espécies aquáticas e ser essencial habitat para uma série de plantas e animais.
“Este tipo de habitat recém-descoberto pode até abrigar animais e plantas endêmicos ainda a serem descobertos e fornece aos ecologistas de várzeas tropicais e estuarinos algo novo para procurar durante futuras expedições de campo”, disse Krauss.
De acordo com o estudo, os cientistas “prevêem que essas florestas podem estar entre os maiores estoques globais de carbono dos oceanos costeiros”, devido à mistura de árvores maduras que crescem em água doce abundante e rica em nutrientes do rio Amazonas.
Os manguezais são um sumidouro de carbono mais eficaz do que outros tipos de florestas tropicais, com um estudo recente revelando que mais de 8% de todos os estoques de carbono do mundo estão nos manguezais do Brasil.
No entanto, apesar de seus imensos serviços, os manguezais não são incluídos em áreas protegidas no Brasil ou vistos como uma prioridade de conservação nos compromissos de redução de emissões do Acordo de Paris. Da mesma forma, a zona de transição entre terra firme e manguezais, conhecida como apicum, não é protegida pela legislação brasileira.
“Um hectare de mangue tem muito mais carbono do que a mesma área na floresta amazônica”, disse Pablo Riul, professor de biologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em entrevista em março de 2022 à Mongabay. “Mas é negligenciado. E sempre foi. As pessoas o veem como um lugar sujo, com muito lixo e esgoto, porque historicamente serviu como lixão para muitas cidades litorâneas.”
Os manguezais estão ameaçados pela criação de camarões, poluição por escoamento agrícola, erosão, desenvolvimento e mudanças climáticas. Em 2020, o ministro do Meio Ambiente do Brasil, Ricardo Salles, tentou acabar com duas resoluções que protegiam os manguezais mas o Supremo Tribunal Federal declarou a medida inconstitucional. Os pesquisadores também dizem que a pesquisa e a conservação de manguezais não são bem financiadas.
“A expedição ao manguezal brasileiro e a subsequente descoberta de manguezais de água doce são fundamentais para pintar o quadro completo da vasta bacia do rio Amazonas”, disse Nicole Alexiev, vice-presidente de ciência e inovação da National Geographic Society, em comunicado à imprensa.
A próxima fase da pesquisa está em andamento no estado do Pará, no Brasil, onde Bernardino e sua colega exploradora da National Geographic Margaret Owuor estão realizando pesquisas para documentar o valor econômico e social das comunidades de manguezais na Amazônia.
Alexiev disse que espera que essas expedições “reúnam novas informações sobre esses ecossistemas críticos e como podemos apoiar soluções para garantir sua proteção”.
Imagem do banner: Franco Ivan Macedo Tafur, membro da equipe de pesquisa de manguezais amazônicos, observa as raízes grossas e aéreas dos manguezais amazônicos. Imagem cortesia de Corey Robinson/National Geographic.
Citação:
Bernardino, A. F., Mazzuco, A. C., Souza, F. M., Santos, T. M., Sanders, C. J., Massone, C. G., … Kauffman, J. B. (2022). O novo ambiente de mangue e composição do delta amazônico. Biologia Atual. doi:10.1016/j.cub.2022.06.071
Rovai, A.S., Twilley, R.R., Worthington, T.A., & Riul, P. (2022). Manguezais brasileiros: hotspots de carbono azul de relevância nacional e global para soluções climáticas naturais. Fronteiras nas Florestas e Mudança Global, 4. doi:10.3389/ffgc.2021.787533
Liz Kimbrough é redator da equipe da Mongabay. Encontre-a no Twitter @lizkimbrough_
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