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Brasília (AFP) – Para o Supremo Tribunal Federal, ele é um criminoso. Para o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados, ele é um herói. Daniel Silveira, um ex-policial impetuoso e musculoso que se tornou deputado e condenado, está dividindo o Brasil a cinco meses das eleições.
Silveira ganhou as manchetes internacionais no mês passado depois que a Suprema Corte o sentenciou a quase nove anos de prisão por atacar verbalmente as instituições democráticas do país e liderar um movimento pedindo a derrubada do tribunal.
No dia seguinte, agindo “em nome da liberdade de expressão”, Bolsonaro perdoou o primeiro mandato do deputado do Rio de Janeiro – provocando uma tempestade em um país já polarizado à medida que avança para as eleições de outubro, onde o presidente de extrema-direita luta para ganhar a reeleição.
Silveira, 39 anos, ganhou fama no Brasil – ou infâmia, dependendo de quem você pergunta – em 2018, ano em que se demitiu da polícia estadual do Rio para concorrer ao Congresso pelo Partido Social Liberal.
Irritando uma multidão de radicais de extrema-direita em um comício de campanha, ele destruiu uma placa de rua em homenagem à ex-vereadora do Rio Marielle Franco, uma feminista e ativista de direitos humanos que foi assassinada no início daquele ano.
Franco, um herói da esquerda, era uma figura de ódio para os conservadores da linha dura. O ato de vandalismo de Silveira ajudou a garantir sua eleição em outubro, na mesma onda de extrema-direita que levou Bolsonaro ao poder.
‘The Rock’ do Brasil
Silveira, cuja cabeça raspada e físico corpulento atraíram comparações com o lutador profissional americano que virou ator Dwayne “The Rock” Johnson, já havia mostrado uma veia rebelde durante seus seis anos como policial: ele foi punido 60 vezes por insubordinação e má conduta, segundo o jornal. Reportagens da mídia brasileira.
Ele logo se tornou um dos mais leais apoiadores de Bolsonaro na câmara baixa, onde muitas vezes ostentava seu distintivo de lapela de marca registrada – duas pistolas cruzadas.
Mas ele era um membro relativamente de baixo escalão da tribo “bolsonarista” até que suas diatribes nas mídias sociais entraram em conflito com a Suprema Corte.
Com os apoiadores linha-dura de Bolsonaro acusando o Supremo Tribunal e o Congresso de conspirar para bloquear a agenda do presidente, Silveira emergiu como o líder mais feroz do movimento pedindo sua deposição.
Em uma série de vídeos, ele atacou o tribunal, dizendo que seus juízes mereciam “uma surra”.
Falando do ministro Alexandre de Moraes, que ordenou que Bolsonaro seja investigado por espalhar desinformação, Silveira disse: “o povo precisa ir ao STF, pegar Moraes pelo pescoço e jogar sua cabecinha de ovo no lixo”.
Ele também fez uma defesa apaixonada da ditadura militar brasileira (1964-1985), que Bolsonaro também admira, apesar de seu histórico de violações de direitos humanos.
‘Jogada de marketing’
Em fevereiro de 2021, Moraes ordenou a prisão de Silveira por supostamente tramar “atos visando prejudicar (o Supremo Tribunal Federal) e o Estado Democrático de Direito”.
Libertado sob fiança, mas proibido de postar nas redes sociais, ele continuou a encontrar maneiras de travar sua guerra de palavras na quadra.
Ele abandonou o monitor eletrônico de tornozelo que deveria usar, barricando-se dentro de seu escritório no Congresso em março, desafiando uma ordem judicial para usá-lo.
Bolsonaro, que disse que a prisão de Silveira “doeu (seu) coração”, rapidamente o perdoou quando o Supremo o sentenciou a oito anos e nove meses de prisão e privou-o de seu direito de ocupar cargos públicos.
“No passado, (presidentes) libertavam ladrões… Eu liberto pessoas inocentes”, disse Bolsonaro em evento em homenagem a Silveira.
O campo de Bolsonaro fez de Silveira um mártir pela causa da liberdade de expressão.
Eduardo Bolsonaro, filho do deputado do presidente, o comparou a Jesus, e ele foi recebido como uma estrela do rock no domingo em comícios pró-Bolsonaro no Rio de Janeiro.
A influência de Silveira na direita aumentou em conjunto com seus problemas legais, o que lhe rendeu uma cobiçada indicação ao poderoso comitê de constituição e justiça da câmara baixa.
Mas “a importância de Silveira no campo de Bolsonaro é mais simbólica do que real”, diz o analista político André Cesar, da consultoria Hold.
Com Bolsonaro perdendo nas pesquisas para o ex-presidente de esquerda Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) indo para as eleições de outubro, “é uma jogada de marketing … para a base mais dura”, disse ele à AFP.
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